Empresas familiares frequentemente concentram sua gestão e poder decisório em uma única figura, o fundador ou patriarca, cuja ausência, ainda que temporária, pode gerar graves consequências administrativas e patrimoniais. A incapacidade ou invalidez do dirigente, quando não há um planejamento jurídico prévio, tende a paralisar operações, abrir espaço para disputas entre herdeiros e expor o patrimônio empresarial a riscos desnecessários.
Do ponto de vista jurídico, a Constituição Federal e o Código Civil asseguram a proteção à autonomia privada e ao planejamento sucessório (arts. 1.784 e seguintes), permitindo a utilização de instrumentos preventivos como o testamento, a curatela e as procurações com poderes de representação. Cada um deles, porém, possui natureza e efeitos distintos, o que exige tratamento técnico integrado.
Testamento
Ato personalíssimo, unilateral e revogável, regulado pelos arts. 1.857 a 1.990 do Código Civil. Sua eficácia ocorre apenas post mortem, razão pela qual serve para dispor sobre a destinação de quotas ou ações, estabelecer cláusulas de incomunicabilidade ou inalienabilidade e indicar diretrizes para a administração futura do patrimônio. Contudo, o testamento não produz efeitos durante a vida do titular e, portanto, não autoriza ninguém a exercer poderes de gestão enquanto ele estiver vivo, ainda que incapacitado.
Curatela
Solução jurídica adequada às situações em que a incapacidade é superveniente, É prevista nos arts. 1.767 a 1.783 do Código Civil e regulamentada pela Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência). A curatela é uma medida judicial de caráter protetivo e proporcional, aplicável apenas aos atos de natureza patrimonial e negocial, e deve ser decretada mediante decisão fundamentada. É possível, entretanto, que o próprio dirigente indique previamente, por meio de escritura pública ou testamento, quem deseja ver nomeado como curador, facilitando a decisão judicial e prevenindo disputas familiares.
Procuração pública com poderes específicos de representação
Instrumento relevante, válido enquanto subsiste a capacidade do outorgante. Permite que um representante pratique atos empresariais em nome do dirigente, mas, conforme o art. 682, II, do Código Civil, extingue-se automaticamente com a interdição ou morte do mandante, motivo pelo qual não substitui a curatela nem garante continuidade plena da administração.
Um plano de proteção eficaz para a empresa familiar deve, portanto, combinar diferentes mecanismos:
– Testamento atualizado e compatível com o contrato social.
– Definição, em acordo de sócios ou estatuto, de regras para substituição do administrador.
– Outorga de procurações limitadas e temporárias.
– Previsão de curatela com curador indicado previamente.
Além disso, recomenda-se a criação de protocolos familiares e societários que orientem a sucessão e a governança, reduzindo a discricionariedade judicial em momentos de crise.
10/10/2025
