A controversa obrigatoriedade na transferência de créditos de ICMS em operações interestaduais: uma análise do Convênio CONFAZ nº 109/2024 (Dr. Fabio Bezana e Dr. Rodolfo Araújo Fernandes – Calábria & Villa Gonzalez Advogados Associados).

Imagem Destacada Fábio Bezana

Entrou em vigor nesta última semana, em 1º de novembro, o Convênio nº 109/2024 celebrado pelo CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária), que promete trazer novas diretrizes a já extensa discussão acerca da ilegalidade na cobrança do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica, tese essa confirmada por decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADC nº 49.

O tribunal na ocasião definiu, por meio da modulação de efeitos temporais, que a decisão teria eficácia no início do exercício financeiro de 2024, o que levou o Congresso Nacional a disciplinar sobre a transferências de crédito de ICMS, regulamentação essa que se deu através da Lei Complementar nº 204/2023, observando o comando constitucional por se tratar de matéria de caráter nacional (art. 155, § 2º, inciso XII, “c”, CF).[1]

Assim, foram inseridos os §§ 4º e 5º no artigo 12 da Lei Kandir (LC 87/96) disciplinando sobre o novo regime de transferência do ICMS na ocorrência de operações de circulação de mercadorias sob a mesma titularidade: poderá o contribuinte optar pela sistemática superada, equiparando a operação à ocorrência de fato gerador (§ 5º), ou então pela nova sistemática na qual não se considerada ocorrido o fato gerador, mantendo-se o crédito relativo à operação anterior (§ 4º).

Quanto a primeira opção, nada mais é do que o regime que já vinha sendo praticado, no qual o contribuinte destaca o ICMS incidente sobre a operação de remessa, aplicando a alíquota interna para transferências no mesmo estado, ou então a alíquota interestadual, quando se tratar de estados diferentes.

Já o novo regime de transferência de crédito de ICMS, previsto no § 4º, possibilita a manutenção do crédito relativo às operações anteriores nas transferências interestaduais. Isso implica dizer que o legislador garantiu ao contribuinte o direito subjetivo (uma faculdade, portanto) de não realizar o destaque do crédito e, por consequência, não o transferir do estado de origem ao estado de destino.

Caso opte pelo destaque do crédito na operação interestadual, a diferença positiva entre o crédito obtido com a operação anterior e o transferido ao estado de destino será garantido pelo estado de origem. Por se tratar de uma faculdade, na prática seria assegurado ao contribuinte decidir o quanto desejaria transferir de crédito ao estado de destino, de zero ao máximo (alíquota interestadual), ou até mesmo manter o crédito total no estado de origem, pois “quem pode o mais, pode o menos”.

O problema é que o recente Convênio nº 109/2024, no parágrafo único da cláusula primeira, ao versar sobre as transferências interestaduais, pareceu extrapolar a redação do § 4º do artigo 12 da Lei Kandir, inserindo limitação que obriga o estado de origem a assegurar apenas a diferença positiva entre o crédito oriundo da operação anterior e o transferido ao estado de destino (baseado na alíquota interestadual), suprimindo o direito do contribuinte à utilização integral do crédito no estado de origem.

Portanto, aquilo que era uma faculdade, na redação da norma emitida pelo CONFAZ se torna uma obrigação: na prática, o contribuinte deverá destacar o ICMS nas operações interestaduais.

Tal restrição certamente poderá ser objeto de questionamento, com razão, principalmente para contribuintes que realizem com frequência a remessa interestadual entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica, como matriz e filial, buscando seu direito à opção de transferência de crédito de ICMS estabelecida tanto pela Lei, quanto pelo STF, e que foi restringida pelo CONFAZ.

[1] Art. 155 (…) § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (…) XII – cabe à lei complementar: (…) c) disciplinar o regime de compensação do imposto;

Fonte – Dr. Fabio Bezana e Dr. Rodolfo Araújo Fernandes – Calábria & Villa Gonzalez Advogados Associados

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